domingo, 28 de agosto de 2011

Gostar de Astrofísica



Devoro tudo o que é documentário sobre astronomia e astro-física, o melhor deles todos é "How The Universe Works", que dá no Discovery Channel, os outros são bons mas este suplanta-os em poder de síntese, na locução, efeitos especiais e no lado didático e explicativo. Já há muito tempo que tinha deixado de pensar no tema, depois de na adolescência ter lido "Cosmos" de Carl Sagan e depois boa parte da colecção de ciência da Gradiva. Agora vejo que muito evoluiu desde "Breve História do Tempo" de Stephen Hawking, e em teorias ousadíssimas como a Teoria das Cordas e da possibilidade do próprio Big Bang não ser mais do que o outro lado de um Buraco Negro. Mas sendo credíveis ou não os "delírios" do popular Michio Kaku prefiro agora algo mais palpável: estrelas e planetas. Da beleza que é o núcleo de ferro da Terra gerar um campo magnético que serve de escudo protector contra o vento solar que por ele já nos teria pulverizado. Um astronauta contava que na protecção duma nave espacial o vento solar vê-se quando se fecham os olhos, num fecho de luz que pisca de 20 em 20 minutos. Faz faísca no globo ocular. Entra no sono e não deixa dormir. 

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Diego Capel



Ontem fui a Alvalade ver o Sporting, voltei para casa a dizer que vi o Capel. O espectáculo foi todo ele, e dele, aquela fúria, aquela vontade de viver o jogo, de transmitir paixão. Generoso, empolgante, incansável, corajoso, artístico. Ou muito me engano, ou Capel dará histórias para contar aos netos. 

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Só falta tocar



Há uma inventividade, energia e grau de aleatório que só podem vir do mais intricado dos realismos. Onde nada do que parece é e num momento tudo se transforma. Aí as formas não existem vincadas a priori, como num enredo mais clássico, nem se deixam ir ao sabor do vento e dos humores do momento; as coisas são como são em Baltimore e não só, na verdade todos nós somos irremediavelmente joguetes de corporações e o jogo está truncado.
Polícias, gangsters, estivadores, políticos, professores, alunos, jornalistas, advogados, todos em barcos diferentes dentro do mesmo rio turvo e perigoso. Muitos a tentar viver da melhor forma possível enquanto se tentam salvar e as feridas não parecem estancar. Não existem aqui maniqueísmos, todos os lados têm o bem e o mal. 
Vendo no You Tube alguns documentários sobre o fenómeno, os cidadãos de Baltimore falam em 99,9% de veracidade, mais que factualmente, é a reprodução desses viver que sai decalcado em "The Wire". O que não cola ali é o argumento de que a criminalidade não é desculpa ou que todos se podem salvar numa cidade com seis vezes a criminalidade de Nova Iorque. Claro que há quem se salve ou se redima, mas não se podem salvar todos. 
Os criadores da obra não se limitaram a investigar o terreno ao pormenor, eles proprios foram parte dele, e durante quase uma vida: Ed Burds, como ex-polícia,  pela maior parte das experiências que servem de matéria prima à série; David Simon (ex-repórter do crime) concebendo-as e pondo em papel, adicionando também as suas como repórter do Baltimore Sun (nomeadamente na 5ª série). Todo o lado da rua - através dos gangs e dramas adjacentes e associados -, experimentaram os dois durante meses, vivendo literalmente no terreno, ao que muito ajudou terem levado ao hospital um "soldado" baleado, o que abriu todas as portas para um acesso"all areas". 
O registo esse jamais foi experimentado e a credibilidade dos criadores serve também de combustível a todos os que dela fazem parte e ao colossal esforço necessário para levar avante algo que nunca foi tentado nem ao de leve. Arrisco dizer que todos experimentam a mesma voracidade, a mesmo desesperança. Para mostrar-nos num espelho a forma como podemos ser esmagados. Do que fica praticamente só nos falta tocar.

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Eu, meu personagem

Meu estar na net é um personagem. Por decalque depois transforma-se em máscara, claro está, não há a mínima hipótese...Ao longo da vida já tive de assumir outros personagens, tão diferentes. Tive de actuar bem, a necessidade aguça o engenho. Constatei então que sendo tímido os meus personagens não têm nada disso. Pelo contrário. Nem sequer o que vem com meu nome. Sempre me senti um género de Jimmy McNulty sem posto. Só desvantagens. Tudo ultra-realista. 

quarta-feira, 17 de agosto de 2011

A.K.A.



Os gangsters dos filmes e séries ajudam a passar o tempo. Como é que se tornaram entertenimento de luxo isso é algo que me escapa, mas também a culpa não é nossa. Lembrei-me disso ao ver na net uma foto de Joe Pistone (a.k.a Donnie Brasco) ao lado do actor que o interpretou, Johnny Depp. 
Pistone era um agente do FBI infiltrado sob a máscara de Donnie Brasco, e uma das causas do estrondoso sucesso da sua missão foi a irmandade e grande camaradagem que tinha com os outros mafiosos que ao que consta eram tipos "normais" que depois matavam e roubavam e ameaçavam e infernizavam a vida ao outro como modo de vida. Acabado o expediente discutiam comida, vinhos, carros, baseball, escola dos filhos, jogavam cartas...O business de resto não era nothing personal. Não se discutia. Matavam ou morriam. Roubavam ou morriam. Obedeciam ou morriam. 
Donnie estava ali para metê-los na cadeia. Ponto que correu mal ao seu melhor amigo no bando, o capo Dominick "Sonny Black" Napolitano a quem um dia prometera que cuidaria das filhas se lhe acontecesse alguma coisa. E aconteceu. Foi morto quando se descobriu que Donnie Brasco era afinal o agente Joe Pistone que depois da missão cumprida tem andado escondido entre tribunais, conferências, livros e aparições mediáticas. À sua custa dezenas deles foram dentro. Incluindo quem matou Sonny Black. Don the jeweler, não era? A fugazi.

domingo, 14 de agosto de 2011

Literatura


A literatura é, e deve ser, um veneno ministrado sabiamente; uma arte de prestidigitador, capaz de, com elegância ou com violência, levantar um sujeito acima do chão, ou tirar-lhe, como quem tira um tapete, o chão debaixo dos seus pés; e a literatura não tem obrigação alguma de conservar o sujeito no ar, em qualquer dos casos: a intencionalidade da literatura consiste mesmo em suspender a acção mágica e em deixá-lo cair, perplexo e perdido, de quanto mais alto melhor.
(...)
Só por si, o hábito da leitura não significa um conhecimento ou reconhecimento da literatura como tal. Mas, ainda que esse reconhecimento se processe em muitos leitores, daí não resulta que eles sintam necessidade de se situar, correlacionar, comparar, historiar o que estimam, que os fira o apetite de comunicarem a outros as observações que fizeram, ou que a literatura ocupe, em suas vidas, um lugar preponderante, absorvente, que seja ela o que dá sentido e estrutura a essas vidas. 
(...)
A literatura não pode ser ensinada. Ensinar seja o que for é apresentar um instrumental adequado e explicar a maneira de uma pessoa tirar proveito dele.
(...)
Há que amar a literatura. Sabemos bem que o amor pode ser fugaz, intermitente, inconstante, frágil, imenso, ocasional, calculado, uma paixão subita, uma paciente conquista. Amando-a, porém, é impossível não querer conhecê-la em toda a parte e em todos os tempos, em extensão e em profundidade, é impossível não querer estudá-la, para transmitir e comunicar aos outros a fascinação que ela exerce sobre nós; é impossível não querer vivê-la, gratuitamente e como agente,que ela é, de tudo o que constantemente se pretende que ela seja e de tudo o que ela constantemente ultrapassa em si mesma e em nós.



Jorge de Sena in O Reino da Estupidez-I

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

A maior jogada de todos os tempos


"Como sabemos, ou deveríamos saber até de mais, o capitalismo - quer a gente queira, quer não queira - não está nada decadente. Está pelo contrário, lançando-se na maior jogada de todos os tempos: a absoluta concentração do poder nas mãos de uma rede de corporações supranacionais."
Jorge de Sena, em 1976...

Lisboa-Cascais (II)



Cravava-me um cigarro, não tenho, respondi. Tu aqui? O comboio aproximava-se. Antes que respondesse, uma senhora idosa fumadora nos setentas veio agradecer a ajuda que dei na máquina dos bilhetes, deixe lá que eu também não sei como é que aquilo funciona, foi de improviso. De olhar tão vivo dava a ideia que envelhecer foi só uma coisa que lhe aconteceu. Ao lado uma mulher magra sentada num banco olhava-nos. Cabelos pretos, convencional, bonita. Ele continuou, "já não vives mais em Campo de Ourique, né...", tão certo de si que confundia viver com aparecer e eu moro sim, são as vidas, chutei para canto.
Entrámos pois na carruagem, ele encontrou logo um amigo com quem iria ter a Cascais  - pontaria - e sugeriu-me que me sentasse de costas no outro lado do corredor. Deixa ficar, detesto andar de costas, dá-me tonturas, saiu-me  em voz alta. E a bonita convencional sentou-se me mesmo em frente. Também me levantei às 5 e meia da manhã e o livro agora era o "Dom Casmurro". Não parava de me olhar,olhar amargo, fixa como uma esfinge. Depois nervosa retirava da carteira papeis de contas, bilhetes Lisboa Viva, calendários de farmácia, alinhava-os e voltavam para a carteira outra vez, depois cremes, para a carteira, depois recibos multibanco, para a carteira. Tonturas. Acabou mesmo por sair na mesma estação onde da ultima vez entrou toda aquela maralha de gente. Já em Cascais creio ter visto Capitu umas horas depois, estava acompanhada por uma amiga. A vila parava por onde passava. Quando acordei já era tarde.